Poesias

"A beleza das coisas está no espírito de quem as contempla. " (David Hume)

"É preciso saber olhar para os olhos de uma criança para saber o que vai na alma." (Torrente Ballester)




Poesias III




Amizade Poética


No tempo em que te sinto,
Nas leituras em que me apago...
Renasço apenas para voltar
Ansiosa para te ter
Em meus braços, poesia…
Que a escreves…
Como se para mim a dedicasses,
Porque se a sinto…
Como tu a sentes!

Naquilo em que descreves,
Nunca ausente… pois se a sentes...
Formosa de tão madrasta ambiciosa!

Que nos mata nesses trilhos tão padrastos
Ingratos, que de ausentes nos levam...
Em embalos de amizades hoje presentes,
De quem as tem e de quem as prende!

Carla Bordalo




















Azedume


Hoje sei que estou
Dentro de uma represa carregada
De tal desolação infindável,
Que me sinto devorada numa inquietude impiedosa
Sem lasca lacada de porta mergulhada,
Em capelas fechadas de velas a findar.

Hoje sei que me sinto
Em profunda nostalgia vazia;
Em três pedaços quebrada;
Apenas três pedacinhos
Que me arrastam longe,
Destes bocados em que me vejo abalar.

Assim estou em tempos assim
E sem poder escrever poesia,
Histórias, contos ou marrafas de emblemas
Pendentes em que me assento.
O banco partiu-se em três lendas
De comédias desajeitadas e impensadas!

Nada cá dentro arremete
Ao que tudo azeda agremente;
Encontro as mesmas teclas de sempre;
Os dedos movem-se sozinhos e escrevem… Por escrever.
As palavras formam-se sem contextos
Repartidas com frases sem nexo… É só ler!

Onde estão escondidos os artefactos,
Que vulgarizam a existência
Absoluta do querer?
E que fazer, se hoje só sei divagar?
Devanear numa beleza apagada
Comprometedora… do nada!

Tenho dias assim…
Eu que não sou eu que aqui estou;
Não sou eu quem matuta
Nesta forma estranha e desconhecida,
Que me prende a este estado emaranhado,
Tresloucado e, sem mente.

Carla Bordalo




















Poltrona do Tempo


Sento na única poltrona do tempo,
Que por mim espera
E em momento me aguarda,
Que o tempo passe depressa,
No horizonte que me atravessa.
Erguendo o nó da corda envolta,
No universo enforcado…
Da época!
Em que tudo roda em volta
Do sol elevando a vontade
Ao homem…
Enquanto esquece a mórbida
Escassez da roda em volta ao Sol
Que roda e anda sem nada deslocar.
E se move com um olhar…
O Sol, em pensamento!

E tão vaga a razão
Hoje em dia…

E enquanto espero, reparo,
Cansada de tanto esperar…
Reparo que ando no sonho do vagar,
Como antes se vive em terra de estar!
Existe o viver sem reparar
Olhar sem olhar…Para Te Ver…
Não tão intensamente como o meu desejar,
Como quem aguarda a volta do dia
A chegada da noite, em tal nostalgia o desejo…
De brancos afectos, que brancos não fiquem,
Sem cor os meus sonhos
Isentos desejos… aos meus afectos,
Com o tempo…
E o tempo, com ele, atento…
Enquanto aguardo e espero que passe o mesmo!
Nem ando, nem vacilo, nem movo… momento…

Em espera … Na única poltrona no tempo.

E na espera que me desespera,
Sobressaltada…
Espero…
Enquanto o tempo que por mim passa
Veloz e azedo
Rodando como uma mera esfera
Uma bola de neve que rebola
E tudo leva
E não espera…
E fico postada, demente,
Vazia, ansiosa na minha mente!
De correr apressada, vaguear como o vento
Correr como a chuva, velozmente…
Esperando… que o frio passe!
Mas corro e tento apanhar o tempo,
E num ápice… num pensamento…

Rodo no tempo com tal lucidez
Correndo com todos à minha volta
Esperando mesmo… que seja de vez!

Carla Bordalo




















Profundo como o Oceano


Conheço no tempo
Que apagou parte de mim,
Em distâncias alheias ao desalento
Rodeado entre o verdadeiro e errado
Do Ser que se perdeu e o abafado.
Silêncio ignorado
No oceano largado.
Enterrado em insânias,
Cometidas de alguma maldade
Ainda… por cometer.

Intencionalmente
Um dia ficou para trás
Uma grande e importante parte,
Estagnada em suja água
Lavada de uma lavagem retida
Por sair em estojo fechado,
Longe do oceano…
Esquecido, esqueceste de procurar
Esquecido, esqueceste de descobrir
O que havia a descobrir.

Demasiados momentos,
Sem sentir que haveria ainda mais que um simples
Lado de cá, ou de lá…
No profundo oceano
Esqueceste de olhar o que podendo ser visto
E só tu poderias enxergar,
Como quem encontra uma agulha
Cravada no peito
Presa por um minúsculo fio…
Na ponta… Para tu veres!

Esteve sempre lá, fechada
Lançada e empurrada ao fundo do mar
Afundada sem perceberes,
Na ostra isolada.
Em justeza irrisória da concha fechada,
Hoje já nada me dói
Muito menos na alma
Oprimida como garantia… em poesia,
Que me livrou da loucura
Daquilo que sentia!

Hoje nem posso seguir em frente.
Tenho o caminho barrado
Por um alfinete lacado,
Em agonia.
E respirar, sempre que tento
Já nada encontro de profundo
Desembaraço em corais do meu forte rolo,
Que me atropela em garras de tubarão
E me atormenta e prende
Num acordar estrondoso de uivos.

Saltos trespassados e caídos
Mal-humorados como inconstantes cavalos,
Em água rolante e incerta.
Embaraçosa, de graves palavras
Cego e muda de escarlates setas,
Na pesca em ondas bravias
Que teimam queimar
Molhando de frente ao trambolhão,
A culpa de… culpar.
Como quem cospe valores…

Constante em manter,
Afirmando que conhece e sabe
De cor o tamanho de um oceano
Que nas algas encobre,
O pó da areia calcada, recalcada… e sem ver,
O que realmente eu sinto.
Batendo o pé na insistência,
De saber, como eu o sinto,
Na profundidade do meu sentir…
Afirmando que o sabe no mais profundo do meu ser!

Carla Bordalo



















Aroma do Jasmim


Sabes meu querido,
Que quando fores velhinho,
Muito velhinho…
Estarei contigo?

Estarei sempre presente
Permanecerei a teu lado
Ainda que doente, sem te levantares,
Estarei sempre!

Absorverei os teus momentos!
Nas viagens, que não fizemos,
Em Sonhos não realizados,
Mesmo assim, nunca perdidos.

Cruzeiros…ainda não navegados.
Mas lá estaremos, juntos!
Em momentos passados e vividos,
Lado a lado recordados.

Difíceis momentos…
De extrema fantasia passados a dois,
A três e a quatro, extrema alegria!
Algum Deus o escreveu, quem o diria!

Dar-te-ei o meu afecto,
Envolvendo-te em companhia,
Para ti viverei como se fosse vida minha
E os dias teus dias, como se fossem só meus…

As horas, essas, como se fossem só tuas!
Vou ler para ti, Não só poesia…
Serei os teus Livros, Jornais e Notícias,
Literatura tua!

Serei os teus olhos, corpo e voz…
Como se fossem os meus sentidos,
Uma lupa aberta, observar
Filatelia, colecções… eternizar!

Levar-te-ei ao colo, se não andares,
Observarei por ti, tudo o que plantaste!
Passearei contigo no nosso jardim
E cheirarei por ti, o aroma do jasmim!

Receberás o sol, durante a noite.
Contarei no dia, os movimentos
Dos teus mais queridos sentimentos
E sentirás as estrelas em mim!

Contar-te-ei novidades sobre o mar,
Planetas, politica e futebol!
Terás momentos apenas teus, e, únicos,
Resguardados no teu lençol.

Quando chover, abrigar-te-ei!
Na sala de conforto que tanto gostas,
Aconchegadinho, e tão perto de mim,
A lareira, para ti… acenderei!

E em dias brilhantes e quentes,
Levar-te-ei a passear!
Em jardins de nossa casa
Que tu, me ensinaste a amar!

Carla Bordalo















Ser Poeta Poetisa …Poesia Mulher!


Sou a luz do tempo…

Estou no vento que conduz…
Como um pássaro que voa,
Num absinto que perdoa,
Ou na flor… que seduz.

Sou a brisa da manhã…

Estou no sol que liberta…
Como um dia de enredos,
Num berço de segredos,
Ou na aurora… que desperta.

Sou a raiz da vida…

Estou no pólen de jasmim…
Como zangão que teima,
No ferrão que ainda queima,
Ou fulgor, de um Arlequim.

Sou mágoa do tormento…

Estou no fervor da calma…
Como o fogo que lhe arde,
Na loucura de uma tarde,
Ou lucidez … que desarma!

Sou mar do oceano…

Estou na onda que embala…
Como as costas da baleia,
Na canção de uma sereia,
Ou no barco, que naufraga.

Sou degelo da paixão…

Estou no frio que enriquece…
Como cálice em lago quente,
De relâmpado incandescente,
Ou trovão … de água doce!

Sou a beleza da cor…

Estou no vale que acolhe…
Como espinhos em mãos raras,
Em campo de roseiras bravas,
Ou montanha, que absorve.

Sou alma da dor…

Estou na chuva que cai…
Como orvalho que chora,
Na saudade que cá mora,
Ou neblina … que se vai.

Sou a noite da lua…

Estou no brilho que ampara…
Como pirilampo do dia,
De névoa em noite sombria,
Ou oásis, que aclara!

Sou a guerra da paz…

Estou na neve que atormenta…
Como águia que atende,
Na musa que se desprende,
Ou temporal que assenta.

Sou arco do amor…

Estou no veneno que acata…
Como um Cupido de flecha,
No casulo abelha-mestra,
Ou no colo… que o mata!

Sou a terra do sol…

Estou no pó que queima…
Como folha verde ancorada,
De pedras na triste calçada,
Ou chorão… de pura seiva…

Na Poesia do Ser…

Carla Bordalo


















Cavaleiro dos Meus Tormentos


Saís… E nem um beijo me dais!
Senhor cavaleiro dos meus tormentos!
Por onde andais?
… Em elevados postes pedestais,
Como quem monta em rinocerontes … ancestrais!

Protegido em ninhos de léguas
Tais… em que orientam a tua vida, como quem
Passa a mão pelo meu cabelo
Sendo no teu o meu mais seco entre os demais…
Nunca!

Nunca o faz…
Então o que o protege o seu ser protegido,
Prometido tal como és…
Em relação aos demais?
Nada!

E sempre voltais,
Meu cavaleiro de fé…
Ante pé, e sem cavalo selado
Sem trela, ensinado e prometido…
… Sem pombais!

Bem…
Num beijo perdido, meu cavaleiro…
Sem cavalo alado,
Modesto o galope
Não te fará forte o espremer da morte
No escalope da sorte!

Carla Bordalo














Histórias de Embalar


E que tal…
Se trocassem a noite
Apenas pelo luar?
Eu cá, vagueava calmamente
Pelo sopro aberto da noite…
E trocaria ainda
O dia pelo teu olhar!
Pela lua, percorreria o sol
Apenas para sonhar…
E tu, tu contavas apenas
Histórias de embalar.
E no luar… ai no luar…
Colheria uma estrela
A mais pequena e singela estrela,
Só para te agradar.

Carla Bordalo















Vagueio na poesia


Vagueio na poesia
Como em colo de minha mãe
Quando de amor me enchia.

Em tela branca a sinto
Recordando, sei-o bem
Que não vejo… nem as pinto!

Carla Bordalo